quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Sobre os momentos mais especiais da vida - II,

Desta vez, estava no topo do Morro do Cuzcuz, lá no alto da comunidade de São Bento de Maragogi, onde há aquela ruína de igrejinha colonial, malassombrada - há quem diga, com suas paredes desgastadas e resistentes ao tempo, sutilmente pintadas pelo lodo e pela maresia do litoral alagoano.

Lembrava-se vagamente da primeira visita que fez ao lugar, muitos anos antes, num tempo em que realidade e fantasia misturavam-se diante dos seus olhos já tristonhos, ambas iluminadas pelo pensamento mágico inerente à pouca idade e pelo espírito aventureiro que carregava consigo desde que se entendia por gente. Na ocasião, levado ao local pelo avô e por outros familiares, muito lhe marcaram os primeiros passos dados já dentro das ruínas. Sutil e cuidadosamente, avançava pelos pequenos corredores: alguns mais claros, iluminados pelo céu azul daquele fim de tarde, outros escurecidos por qualquer resto de telha mais resistente ao passar dos anos. O chão era irregular e nele misturavam-se mato, pedregulhos e - para o seu eterno espanto, viu ainda um ou dois ossos de gente. O céu escurecia e seu avô lhe chamou a atenção: "olha em direção às telhas e repara nas frestas, por onde entra alguma pouca luz". Olhou com atenção. O velho: "vê?"; diante de seu silêncio, o avô insistiu: "repara, são como flashes de luz". Não demorou muito até que se desse conta. Aquilo foi impressionante, coisa surreal de tão bonita. Olhando em direção às telhas, com suas frestas que davam vista para o céu azul escuro lá fora, percebeu pequenas faíscas cintilantes; apareciam e sumiam na rapidez de um piscar de olhos, contrastando com a escuridão etérea do pano de fundo. O velho deu uma risada ao ver o espanto do pequeno neto e falou: "é o fogo fátuo, coisa de espírito".

Desde aquele dia, com muito respeito e com certa frouxidão - não vou negar, voltei algumas vezes à igrejinha. As ruínas continuam as mesmas, com suas paredes escurecidas, habitadas pelo mato que dá caminho até os pequenos túmulos de azulejo, tão simples e honestos. Sozinho em umas ocasiões, acompanhado em outras, sempre optei pelos finais de tarde, na vã esperança de voltar a ver aqueles belíssimos fragmentos de luz mágica que tanto me impressionaram em outros tempos. Se os olhei, não vi e se os vi, não enxerguei.  Em todas as visitas, porém, encontrei, sobretudo, a mim mesmo. Lá do alto, é possível ver a imensidão do mar, através daquela paisagem apaixonante e sincera que é o litoral alagoano. Tenho certeza de que os fogos fátuos ainda habitam a igrejinha e fazem dela a sua morada, dando sua bênção aos errantes e nos iluminando aos caminhantes do céu.

Um comentário:

Sofia disse...

Me projetei la com voce primo. Eita tempos saudosos em que o MUNDO parecia ir so da vendedora de bolo de goma ate o bar do pele :)